A garantia constitucional, acesso à saúde e autodeclaração contribuem para o aumento da população indígena brasileira.

Em 1991, o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) registrava 294.131 indígenas no Brasil. Agora, no Censo de 2022, a contagem subiu para impressionantes 1.693.535, representando um aumento de 476%. Esse crescimento surpreendente chama a atenção, especialmente considerando a tradição nacional de maltratar os povos indígenas, muitas vezes chegando ao extremo de exterminá-los, especialmente durante os quatro anos de mandato do ex-presidente Jair Bolsonaro.

No entanto, é importante ressaltar que diferentes fatores contribuíram para esse cenário favorável, nem todos relacionados diretamente ao aumento da natalidade ou à diminuição da mortalidade. Embora esses fatores tenham contribuído, é necessário considerar que o próprio IBGE modificou seus critérios de contagem ao longo das décadas.

Antes de analisar as mudanças metodológicas, é necessário lembrar de um acontecimento importante que ocorreu alguns anos antes de 1991: a promulgação da nova Constituição em 1988. O artigo 231 reconheceu o direito originário dos povos indígenas às terras que eles ocupam. Essa conquista legal foi fundamental para reverter séculos de usurpação e opressão por parte do Estado e de particulares. Embora o processo de demarcação de terras indígenas ainda não esteja concluído, a expectativa de direitos e as primeiras homologações parecem ter diminuído a pressão da fronteira agropecuária sobre essas áreas.

O governo brasileiro também tomou medidas importantes para proteger os indígenas. Em 1992, durante a Cúpula da Terra no Rio, ocorreu a homologação de uma área de 96.650 km², maior que Portugal, para os yanomamis. Essa medida foi uma resposta às pressões domésticas e internacionais após massacres e demonstrou um esforço em erradicar o garimpo ilegal nesse território. Além disso, ao longo do tempo, houve melhorias no atendimento de saúde, mesmo que precárias, o que contribuiu para o aumento da população indígena em diversas regiões, especialmente na Amazônia.

Os dados do IBGE revelam que o maior salto no registro da população indígena ocorreu entre os censos de 1991 e 2000, quando o número de indígenas no país passou de 734.127 para 1.693.535, representando um aumento de 150%. Houve também um aumento significativo (88,8%) entre os censos de 2010 e 2022, o que mostra um crescimento contínuo dessa população. O demógrafo José Eustáquio Diniz Alves, aposentado do IBGE, atribuiu esses números ao melhoramento da cobertura do instituto em áreas indígenas e às ações afirmativas que estimularam a autodeclaração.

Outro aspecto interessante é a reafirmação étnica que está ocorrendo no Nordeste brasileiro, onde atualmente reside a segunda maior população indígena do país, com mais de meio milhão de pessoas. Populações que antes eram descritas como “caboclas”, descendentes de indígenas que foram reduzidos a aldeamentos, miscigenadas e marginalizadas, estão resgatando suas identidades e reivindicando as terras de seus antepassados.

Em suma, após séculos de genocídio e opressão, os povos indígenas no Brasil estão se recuperando gradualmente. Os avanços na proteção legal, o combate ao garimpo ilegal, o acesso a serviços de saúde e as ações afirmativas têm contribuído para esse aumento expressivo do número de indígenas no país. Mesmo diante de tantos desafios e adversidades, é reconfortante perceber que nem tudo está piorando em nosso país.

Fonte: O texto foi reproduzido e adaptado com base no artigo “População indígena do Brasil aumenta 476% desde 1991, segundo o Censo de 2022” publicado na Folha de São Paulo em 04 de agosto de 2022.

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