Os julgamentos sobre mães revelam a ideologia do meio em que surgem, uma reflexão acerca da visão social sobre maternidade.

 

A expressão popular “mãe só tem uma” tem sido usada há séculos para diferenciar a mãe biológica, geralmente branca, da figura da mãe de leite ou ama-seca, que eram escravas negras responsáveis por cuidar das crianças que posteriormente se tornariam seus próprios donos. Essa expressão servia para ocultar a realidade de que sempre houve diversas mães, nem sempre da mesma etnia.

No entanto, nos dias de hoje, “mãe só tem uma” também é uma forma de simplificar e homogeneizar a figura materna, como se todas fossem iguais na dedicação e cuidado com os filhos. A ideia é de que ao se tornar mãe, a mulher se transforma em uma espécie de super-heroína, apagando automaticamente qualquer aspecto de sua vida anterior que não esteja relacionado à maternidade.

Essa idealização da figura da mãe ao longo da história está intrinsecamente ligada à divisão sexual do trabalho, na qual as mulheres são socialmente designadas para serem as cuidadoras da casa, da família e da sociedade. Essa expectativa imposta às mulheres tinha como objetivo desonerar os homens, as empresas e o Estado das responsabilidades do cuidado, em troca do reconhecimento social e cultural que a mulher receberia ao ser vista como uma mãe exemplar.

No entanto, essa pressão sobre as mulheres para serem as “belas, recatadas e do lar” tem consequências negativas, como o esgotamento físico e mental, ou burnout, das mães que se sentem sobrecarregadas com tantas demandas. Atualmente, as mídias ainda têm o poder de enaltecer ou cancelar as mães, contribuindo para a pressão e expectativas irreais.

A lenda de que as mulheres são naturalmente cuidadoras e os homens são os provedores financeiros tem sido questionada. A realidade é que a maioria das mulheres sempre teve que cumprir as duas funções, enquanto muitos homens não cumprem sua parte no sustento da família.

Um exemplo disso é a licença-paternidade, que atualmente é de apenas cinco dias no Brasil. Existe uma discussão para aumentar esse benefício, reconhecendo a importância da presença do pai nos cuidados com os filhos.

Ao longo dos anos, as obrigações das mulheres aumentaram, enquanto as expectativas tornaram-se cada vez mais surreais. Isso se reflete no julgamento midiático de casos como o da atriz Larissa Manoela, cujos pais a teriam impedido de ter acesso à sua própria fortuna. O foco é sempre na mãe, como se o pai não tivesse participação ou responsabilidade no assunto.

Vivemos em um mundo em que a interpretação sobre a figura materna oscila entre uma imagem idealizada e uma imagem negativa. Porém, é importante lembrar que existem diversos tipos de mães, assim como existem diversos tipos de mulheres. Em cada mãe, assim como em cada pessoa, há uma complexidade de emoções e sentimentos que podem se revelar de diferentes formas na relação com os filhos.

Portanto, é necessário refletirmos sobre as expectativas e fantasias que projetamos nas mães, reconhecendo que elas também são seres humanos sujeitos a erros e acertos. Além disso, é importante garantir que haja uma divisão igualitária das responsabilidades e um reconhecimento do papel dos pais na criação dos filhos.

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